37 denúncias de crimes
O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal (CDHM), deputado Helder Salomão (PT), denunciou o presidente Jair Bolsonaro à Organização das Nações Unidas (ONU) por negar, amenizar e enaltecer a ditadura e a tortura. A denúncia, feita nesta terça-feira (19), foi encaminhado à alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet.
O documento também foi enviado ao relator especial para execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias Agnes Callamard, e ao relator especial para a Promoção da Verdade, Justiça, Reparação e Garantias de Não Recorrência, Fabián Salvioli.
Os vices-presidentes da CDHM, Padre João (PT-MG), Túlio Gadêlha (PDT-PE) e Camilo Capiberibe (PSB-AP), assinam a denúncia, juntamente com Helder Salomão.
A motivação parte de uma série de fatos e manifestações protagonizadas por Jair Bolsonaro, pelo governo ou por altas autoridades. De acordo com os parlamentares, essas ações “têm o objetivo de criar milícias armadas para defender o projeto autoritário em curso no Brasil. Alertamos que há uma tentativa de implantar um governo ditatorial no Brasil”, reforça o documento.
Os deputados lembram que, desde 2016, o Brasil passa por “uma série de rupturas do Estado Democrático de Direito, o que se agravou com a eleição de um apologista da tortura e da ditadura à Presidência da República em 2018, Jair Messias Bolsonaro”.
“Desde que assumiu o cargo, em 2019, Bolsonaro vem reiterando seu endosso ao regime de exceção, o que se agravou recentemente com sua participação em atos que pedem a intervenção militar, o fechamento do Congresso e da Suprema Corte, e a adoção de medidas como cassação de direitos políticos”, enfatiza.
Para Helder Salomão, “existe um ambiente crescente de adesão, por parte das mais altas autoridades, à legitimação da tortura, das execuções sumárias e da ditadura. Não bastasse tudo isso, um grupo chamado ‘300 do Brasil’ tem se organizado pregando táticas de guerrilha para “exterminar a esquerda” e “tomar o poder para o povo”.
A denúncia
Entre os 23 fatos narrados no documento enviado para a ONU pelos integrantes da CDHM estão, por exemplo, a orientação, em março de 2019, por parte de Bolsonaro, para que fossem feitas as “devidas comemorações” no dia 31 de março, data que marcava os 55 anos do início da ditadura no Brasil. Ele disse ainda que o período entre 1964 e 1985 não foi de ditadura e que o regime não teve uma política repressiva.
Em 10 de junho de 2019, o governo publicou o Decreto n° 9.831, remanejando os onze cargos de perito do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) para o Ministério da Economia e exonerando os então ocupantes.
No dia 24 de julho de 2019, a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos emitiu atestado de óbito declarando, com base em documentos oficiais, que Fernando Santa Cruz faleceu em 1974 em razão da violência praticada pelo Estado no regime de exceção. Fernando Santa Cruz era pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz.
Em 29 de junho de 2019, Bolsonaro declarou, a respeito de Fernando Santa Cruz: “Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como o pai dele desapareceu no período militar, eu conto para ele. Ele não vai querer ouvir a verdade”.
Já em 5 de agosto de 2019, Bolsonaro defendeu que os policiais que cometem homicídios em serviço não devem ser processados, e, referindo-se ao crime nas favelas, disse: “Os caras vão morrer na rua igual barata, pô. E tem que ser assim”.
Um mês depois, em 4 de setembro de 2019, criticando a alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, Bolsonaro exaltou Pinochet, ao felicitar aqueles que “tiveram a coragem de dar um basta à esquerda em 1973, entre esses comunistas”, em referência ao pai da ex-presidente chilena.
No começo de 2020, o então secretário especial de Cultura, Roberto Alvim, usou trechos de um discurso de Joseph Goebbels para programa governamental de incentivo à arte. No dia 25 de fevereiro, Jair Bolsonaro divulgou convocação de ato contra o Congresso Nacional, agendado para 15 de março. Em 1º de março de 2020, Bolsonaro afirmou que “Tortura é cascata para ganhar indenização”.
Em 15 de março, data que ficou conhecida como “Bolsonaro’s Day”, houve manifestações em vários lugares do país, com a participação pessoal do presidente em Brasília, com pedidos de intervenção militar, fim da imprensa, de fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. O Brasil já enfrentava a pandemia do novo coronavírus e mesmo assim o presidente incentivou as aglomerações.
Em 31 de março de 2020, aniversário do golpe militar, Bolsonaro voltou a afirmar que não houve golpe em 1964. Ele afirmou ser esse o “dia da liberdade”. Na mesma data o vice-presidente General Hamilton Mourão, afirmou que em 1964 as Forças Armadas “intervieram na política nacional para enfrentar a desordem, subversão e corrupção”.
No dia 19 de abril, Bolsonaro participou de nova manifestação, em frente ao Quartel General do Exército, que pedia o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, a intervenção militar e a volta do Ato Institucional nº 5, publicado em 1968, que permitiu o fechamento do Congresso, a cassação dos direitos políticos e o fechamento do regime. O Brasil já vivia um estado avançado da transmissão do coronavírus. Em 3 de maio de 2020, Bolsonaro participou de mais um ato contra o Congresso e o Supremo.
O relato da denúncia se estende até o dia 10 desse mês, quando a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República usou um lema associado ao nazismo — “O trabalho liberta”— para divulgar as ações do governo contra o coronavírus: “O trabalho, a união e a verdade libertarão o Brasil”.
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