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A terceirização e a fábrica de amputados

19/10/2015 - 9h32 - Sinttel-ES - Tania Trento
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Privatizadas pelo PSDB na década de 1990, as empresas de energia elétrica brasileiras passaram a contratar trabalhadores terceirizados para executar seus serviços e os deixaram literalmente à mercê da intempérie. Sem plano de saúde e praticamente nenhum treinamento, estes trabalhadores fazem de tudo: cavam buracos, sobem em postes de luz, carregam cabos… Todos os anos centenas de terceirizados são vítimas de choques de alta voltagem; a maioria morre ou tem membros amputados –não há números precisos porque a fiscalização é falha.

Segundo o estudo Terceirização e Desenvolvimento: Uma Conta que Não Fecha, feito pela CUT (Central Única do Trabalhador) em parceria com o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), as empresas terceirizadas são, por natureza, precárias em termos de condições de trabalho, porque assumem os riscos sem ter condições econômicas e tecnológicas para gerenciá-los. “As terceirizadas abrigam as populações mais vulneráveis do mercado: mulheres, negros, jovens, migrantes e imigrantes. Esse ‘abrigo’ não tem caráter social, mas é justamente porque esses trabalhadores se encontram em situação mais desfavorável e, por falta de opção, submetem-se a esse emprego”, diz o dossiê. “A terceirização está diretamente relacionada com a precarização do trabalho.”

A remuneração dos terceirizados é 24,7% menor do que a dos trabalhadores contratados mesmo com uma jornada de três horas a mais por semana, sem considerar as horas extras. “Se a jornada dos trabalhadores em setores tipicamente terceirizados fosse igual à jornada de trabalho daqueles contratados diretamente, seriam criadas 882.959 vagas de trabalho a mais.” A rotatividade é alta: enquanto a permanência no emprego é de 5,8 anos para os trabalhadores diretos, para os terceirizados a média é de 2,7 anos.

As jornadas maiores e o ritmo de trabalho exaustivo, combinados à falta de qualificação profissional, funcionam como um coquetel explosivo quando se trata do setor elétrico. As estatísticas demonstram que os óbitos são três vezes mais frequentes entre os terceirizados do que entre o pessoal contratado, sendo que, no setor elétrico, o índice de acidentes é 5,5 vezes maior que em outros setores. O motivo, em geral, é alguma precariedade, como falta de equipamentos de proteção e treinamento. 62% das mortes foram ocasionadas por choque.

Em 2012, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) manifestou sua preocupação com a mortalidade entre os terceirizados do setor elétrico com base nos números do ano anterior: em 2011, das 79 mortes registradas no setor elétrico, 61 foram de trabalhadores de empresas terceirizadas. Uma reportagem no site do tribunal contou a história do trabalhador terceirizado E.Q., de Linhares (ES), que, em consequência de um choque de 13 mil volts, perdeu todo o braço direito, teve o braço e a mão esquerdos inutilizados, perdeu um testículo e ainda teve queimaduras por todo o corpo, inclusive no pênis.

O documentário Dublê de Eletricista, produzido pelo Sindieletro, de Minas Gerais, traz o depoimento de um destes trabalhadores acidentados, Lúcio Nery de Souza, e mostra como as empresas terceirizadas simplesmente colocam os contratados para subir nos postes de energia sem qualquer tipo de treinamento. “Eu comecei a subir (em postes) desde a primeira semana. Não tinha nenhum treinamento”, diz Lúcio. O trabalhador conta que fez o exame admissional em um dia e no outro já viajou a serviço.

Em abril, o Ministério Público do Trabalho também divulgou um mini-documentário sobre a terceirização do trabalho e os amputados do setor elétrico. Segundo o MPT, 8 de cada 10 acidentes de trabalho registrados no País são de trabalhadores terceirizados.

“Desde os anos 1980 essa onda terceirizadora tem crescido no mundo, por pressão neoliberal. Essa classe terceirizada é representada por vários sindicatos (antes, todo trabalhador do setor elétrico era de uma categoria só, a dos eletricitários), e com isso a representatividade é pulverizada e o poder de reivindicação enfraquece. Como um golpe de misericórdia, os neoliberais exigem a flexibilização das leis trabalhistas, ou seja, a prevalência da negociação coletiva sobre a lei. Sem força para negociar, e pressionados pelo fantasma do desemprego (que aumenta com a crescente automação), esses trabalhadores submetem-se ao trabalho mal remunerado e desprotegido” comenta René Dubois Júnior, pesquisador em Ciências Sociais e Direito. “Repete-se, assim, a terrível experiência do trabalho escravo, que serviu para construir o grande patrimônio dos que hoje são os mais ricos do mundo, mas que se constituiu na mancha mais ultrajante da história.”

Vocês acham que o PSDB tem algum arrependimento em relação a isso? Que nada. Agora o partido atua para ampliar a terceirização para todos os setores. Na audiência pública realizada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado na terça-feira 13 para discutir o PLC30, que trata da terceirização sem limites, entidades patronais e o economista José Pastore, ligado ao PSDB, minimizaram o problema da precarização e as diferenças salariais. Mas o governo do PT tampouco tem mostrado uma postura firme ao combater a terceirização. Quem perde com isso –braços e pernas, inclusive – é o trabalhador.

Por Cynara Menezes, no blog Socialista Morena – 18/10/2015

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