GREVES GERAIS
A greve que se aproxima será marcada, mais uma vez, pela defesa da Previdência Social, mas segundo Júlio Turra, diretor executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), se agregam à pauta reivindicações particulares das categorias e reivindicações gerais. O sindicalista destaca que a defesa da educação também será destaque na greve, além da luta contra privatizações das empresas estatais e o combate ao desemprego.
Para Turra, militante histórico detido pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) da ditadura militar na década de 1970, greves gerais têm a característica particular de elevar a luta econômica para campo da política. “Não é simplesmente a reivindicação de uma ou outra categoria, é uma reivindicação do conjunto da classe, que coloca a responsabilidade do governo de tudo”, explica.
Neste especial, o Brasil de Fato resgatou a história das principais greves de trabalhadoras e trabalhadores presenciadas pelo país.
Outro estopim para a generalização das paralisações foi a morte do jovem militante anarquista espanhol José Martinez, em São Paulo, após a repressão da cavalaria a um protesto operário na porta da fábrica Mariângela, no bairro do Brás. Milhares de pessoas acompanharam o corpo de Martinez até o sepultamento.
A greve se espalhou pela capital paulista até chegar ao Rio de Janeiro e Porto Alegre. Armazéns foram saqueados e veículos incendiados.
As ligas operárias e o Comitê de Defesa Proletária, de maioria anarquista e socialista, coordenaram todo esse movimento, reivindicando, entre outras pautas, a abolição da exploração do trabalho de menores de 14 anos, o fim dos turnos noturnos para mulheres e menores de 18 anos, jornada de trabalho de oito horas, e aumento salarial. Estima-se que cerca de 43.800 trabalhadores tenham aderido ao movimento, somente em São Paulo.
No dia 18 de março, uma passeata chamada de “Panela Vazia” reuniu 60 mil pessoas no centro da cidade, em um trajeto da Praça da Sé até a sede do governo do estado. Uma semana depois, 300 mil trabalhadores do setor têxtil, vidraceiros, metalúrgicos, gráficos e marceneiros cruzaram os braços.
“As greves gerais sempre colocaram o governo em questão, por ser um movimento de conjunto da classe trabalhadora, além da pauta econômica, que via de regra detonava a mobilização e a preparação das greves gerais. Ela acabava tendo um impacto político muito grande”, afirma o dirigente da CUT Turra.
Com muitos sindicatos atrelados à estrutura corporativista, os trabalhadores passaram a se organizar em “comitês de empresas”, formando posteriormente uma Comissão Intersindical, mudando a organização sindical e deixando de lado a estrutura anterior, aparelhada pelo Estado.
Apesar de 400 grevistas terem sido demitidos após o fim da greve, os trabalhadores conseguiram 32% de aumento salarial e a indicação de João Goulart, que futuramente seria eleito presidente, para o ministério do trabalho do governo Vargas.
A greve foi considerada ilegal pela Justiça após pedido da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que por sua vez afirmou que não concederia reajuste acima dos 44% combinado com a Federação dos Metalúrgicos de São Paulo. A paralisação, no entanto, persistiu utilizando o fundo de greve criado pelos trabalhadores para receber doações de alimentos.
Cerca de 80 mil metalúrgicos decidiram manter a mobilização até que o reajuste fosse aceito, e a greve se alastrou por outras cidades industriais. No estádio Vila Euclídes, houve uma assembleia com a presença do bispo de São Bernardo, dom Claudio Hummes, que rezou com os trabalhadores o “Pai Nosso”.
Menos de uma semana após o início da paralisação, milhares de policiais militares ocuparam São Bernardo, e tropas de choque, cavalaria e cães foram usados para reprimir os trabalhadores. Após 10 dias, Murilo Macedo, então ministro do trabalho, determinou intervenção federal nos três sindicatos, o que transferiu as reuniões dos sindicatos para a casa paroquial da Igreja Matriz de São Bernardo, cedida por dom Claudio, que décadas mais tarde se transformaria em arcebispo de São Paulo.
Depois de duas semanas, , por sugestão de Lula, a greve foi suspensa por 45 dias por conta da repressão. A suspensão, no entanto, não diminuiu a mobilização da categoria e as reuniões continuaram às escuras na matriz. Exemplo disso foi a manifestação do dia 1º de Maio, que reuniu 150 mil pessoas no estádio de Vila Euclides.
Mesmo a reivindicação inicial de reajuste tendo sido de 73%, a última assembleia ao fim do período de 45 dias aprovou uma proposta de 63%, o que pôs fim à greve, com o saldo de ampliação da capacidade de mobilização e organização do movimento sindical metalúrgico. A intervenção federal foi suspensa e, no dia 18 de maio, a diretoria eleita reassumiu o sindicato.
Nesse cenário, 35 entidades sindicais e associações de funcionários públicos decidiram por decretar greve, incluindo, além dos petroleiros da RLAM e da REPLAN, trabalhadores do Rio Grande do Sul, Pará, Minas Gerais, Cubatão (SP) e Duque de Caxias (RJ). Tiveram apoio de diversos setores da sociedade, como estudantes, partidos de esquerda, a Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI).
O governo recuou inicialmente, mas pouco tempo depois, no dia 29 de junho, baixou o decreto 2.036, que cortava direitos de funcionários das estatais, como o abono de férias, promoções, auxílio alimentação e transporte, salário adicional anual e participação nos lucros.
No dia 5 de julho, o turno noturno da REPLAN parou contra o arrocho salarial, a manipulação do Instituto Nacional de Concurso Público (INPC), o Decreto-Lei 2.036, o entreguismo governamental e o acordo com o FMI, o que culminou em intervenções do governo. A greve atingiu também a RLAM, metalúrgicos, químicos e trabalhadores do transporte do ABC paulista.
A paralisação foi duramente reprimida pelo regime militar, resultando na intervenção nos sindicatos dos metalúrgicos em São Bernardo do Campo (SP) e Diadema (SP) e no sindicato dos petroleiros em Mataripe e de Campinas. Em Paulínia (SP) 153 foram demitidos, e 205 em Mataripe. No dia 11 de julho, a greve foi cessada.
As medidas do Plano Cruzado 2 fizeram os preços voltarem a subir, aumentando a arrecadação de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). O ajuste salarial passaria a depender de um gatilho, disparado apenas quando a inflação atingisse 20%. Os índices de inflação, porém, eram “ajustados” a fim de evitar o disparo.
A PL foi arquivada na época. Anos depois, em 2017, a proposta de FHC seria incorporada pela reforma trabalhista do presidente em exercício, Michel Temer (MDB).
A reforma trabalhista seria aprovada no legislativo e sancionada no dia 13 de julho de 2017, alterando significativamente a CLT e permitindo que a negociação entre patrões e trabalhadores prevaleça sobre a legislação.
Já a reforma da Previdência foi barrada. Mas voltou à pauta como carro chefe do governo Bolsonaro. O governo federal e a cúpula do presidente concentram todas as forças na aprovação da medida, mas têm encontrado dificuldade de articulação no Congresso. E resistência nas ruas.